19 de abril de 2011

Para quê tanta vida?


  Venho tentando há algumas vidas, mas tem sido inútil – não consigo me ajustar à sociedade. Acho que não nasci no corpo que deveria. Não me encaixo nesse ser humano que me foi imposto. Na verdade, acredito que meu ser não satisfaça a nenhum molde. Não suporto padrões, convenções ou regras. Sou uma alma livre, que não pertence a nenhum grupo. Nenhum corpo me abrigaria adequadamente. Ora, eu não nasci para o abrigo, muito menos para o adequado.
  Esse anseio pela liberdade pode parecer uma utopia clichê, mas eu busco por algo muito além. Não consigo encarar a realidade e vivo em meu mundo paralelo. Alguns chamam isso de imaturidade, mas creio não ser tão patética assim. A verdade é que eu não consigo enxergar sentido em nada. Não tenho motivações para ouvir o que me dizem, para agir como age a maioria – todos esses corpos produzidos em série – ou para atender às expectativas alheias.
  Meu espírito livre vaga sonhando e fugindo da podridão em que o meu corpo inerte, inútil e morto se encontra. Meu ser é um mero reflexo da imundice daquilo que a humanidade se tornou. O que me difere dos outros é a minha transparência – afinal, quem quer ser um lixo, quando todos te desafiam a provar o contrário? Eu não temo em afirmar que somos todos uns lixos. Podres.
  A morte é a origem de inúmeras perguntas, mas, ao mesmo tempo, é a nossa única resposta. Para quê essa existência vã? Para quê tantos sofrimentos, tantos desgastes, tantas desilusões, se, no fim, seremos todos comidos por animais, tão nojentos e desprezíveis quanto nós, debaixo da terra? Para quê tanta vida?
  Quando morrermos, apodreceremos de fato. Mas essa será apenas a representação óbvia e concreta do que sempre fomos. Quem pensa que faz alguma diferença para o mundo está errado. As pessoas são substituíveis e a sociedade nunca sentirá a falta de ninguém. Todos seguem o que lhes é imposto para se afirmarem enquanto indivíduos vivos, porque, depois da morte, a verdadeira face de cada um será exposta sem a menor sutileza. Sem a mínima pena.
  Eu queria ser capaz de me iludir, de não perceber que sou um peso morto no mundo. Queria conseguir ignorar o fato de que existo e respiro, mas não vivo. E, se não vivo, é porque para isso não vejo motivos, não tenho perspectivas. Ao mesmo tempo, porém, ainda me flagelo por ser tão errada, tão estragada. Não queria ser eu aquela a exibir descaradamente a falha humana. Mas eu estou condenada a isso, porque sou densa – pessoas densas têm dessas coisas, esses frequentes problemas e angústias existenciais. São elas as que mais sofrem consumidas por essas depressões eventuais, e recorrem a métodos variados de escapismo.
  Quero fugir daqui, voltar para o meu mundo paralelo e para lá teletransportar não só minha mente, mas também o meu corpo. Estou cansada disso tudo. Tudo mesmo.  
  Onde fica a saída de emergência? Essa vida mais parece uma prisão. Nascer foi a coisa mais frustrantes que eu já fiz.