5 de fevereiro de 2012

Saudade disto aqui.

Só queria dizer isso mesmo.

29 de outubro de 2011

Parasita


   “Você não faz ideia. Você não é capaz de imaginar quantas vezes. Você nunca saberá”.

  Naquele breve momento em que ele desviou o olhar. Naquele rápido instante em que ele pareceu se esquecer a preciosidade que tinha em seus braços. Ele se distraiu. Ela chorou.
  Eles estavam tão próximos, mas, ao mesmo tempo, tão distantes. Ela já aprendera a guardar as lágrimas para si. As lágrimas que escorriam pelo seu rosto e pousavam, silenciosamente, no colo dele – ele nunca as havia notado, eram imperceptíveis para qualquer um, que não ela.
  “Essas lágrimas, que são só minhas. De mais ninguém. Não as divido com mais ninguém”.

  Egoísta e individualista. Ela sempre quis tanto ser querida, notada e amada, mas quanto menos recebia, menos doava. Por que se sacrificar por toda aquela gente presa em seus mundinhos particulares?
  “Eu não consigo mais. A solidão me consome e me sufoca. Não percebem o que eu quero?”

  Suas vontades: prioridade máxima. Invioláveis. Mas ele ainda realiza suas vontades.
  “Não é o bastante”
  Ele realiza todas elas.
  “Ainda não é o bastante”
  Ele tenta compreendê-la
  “Nunca será o bastante”

  Bastante ela, era o que havia. Ou melhor, mais que o bastante. A solidão a sufocava, porque ela sufocava as pessoas com tanto ‘ela’. Mas quem é ela?
  “Você nunca saberá. Ninguém nunca saberá. Nem mesmo eu”
  Deixe-o ajudá-la.
  “Ele não seria capaz”

  Ela, que se acha tão única e complexa. Tão incompreendida.
  “Não me diga o que sou”
  Ele quer descobrir.
  “Ele não tem esse direito”

  Ninguém tem esse direito.

  “Ninguém”

  Orgulhosa. Presunçosa. Pensa que aquilo que os outros pensam não vale nada. As opiniões alheias não a interessam. O que os outros dizem, ela não escuta.
  “Não vale a pena”
  Ele só quer abrir seus olhos.
  “É tudo da boca pra fora”

  Eles estão indo embora.
  “Não me deixem só”

  Ela nunca os ouviu.

  “Não desistam de mim”

  Eles nunca a ouviram.

  Ela só quer que sentem-se ao seu lado. Ela só quer que digam que
  “Vai ficar tudo bem”

  É o que ela quer ouvir. 

4 de julho de 2011

Decepção

- Posso lhe dizer uma coisa?
- Pois diga.
- Você nunca irá me decepcionar.
Silêncio.
- Ouviu o que eu disse?
- Ouvi sim.
- Por que o silêncio?
- Permaneci calada para não te decepcionar pela primeira vez.
- Não compreendo.
- Então te explicarei. Eu simplesmente não entendo como você pode afirmar isso. Quero dizer, sempre decepciono todos ao meu redor. Nunca alcanço as expectativas alheias... nem mesmo as minhas. Decepciono até mesmo a mim, essa é a verdade.
- Não, não. Você está errada.
- Em que ponto estou errada?
- Reforço o que disse no início: você nunca me decepcionou e nunca me decepcionará.
- Pois acabo de lhe dizer o contrário!
- Você está se referindo às demais pessoas, não a mim.
- E qual seria a diferença?
Silêncio.
- Vamos, me diga! Por que eu não sou uma decepção apenas para você?
- Bom, talvez eu esteja ligeiramente errado.
- Eu disse! Pelo menos nisso eu acerto. Sei o fracasso e a decepção que sou. Sei bem disso.
- Não, você não me entendeu.
Silêncio.
- Talvez eu esteja errado em achar que sou a única pessoa que não te vê como uma decepção.
- Não, nesse ponto você está certo sim.
- Acho que você ainda não está me entendendo. As pessoas se decepcionam quando esperam algo das outras, quando colocam muitas expectativas em alguém. A decepção acontece quando esse alguém não supera essas expectativas. Ou melhor, até mesmo quando esse alguém não corresponde, minimamente, às expectativas. Entendeu?
- Sim, eu sei bem o significado de decepção.
Risos constrangidos.
- Mas você parece não conhecer tão bem o seu significado.
- Meu significado?
- Sabe qual é o seu significado?
Silêncio.
- Você é insignificante.
Silêncio.
- E sabe por que você não é uma decepção?
Silêncio.
- Porque ninguém espera nada de você.

19 de abril de 2011

Para quê tanta vida?


  Venho tentando há algumas vidas, mas tem sido inútil – não consigo me ajustar à sociedade. Acho que não nasci no corpo que deveria. Não me encaixo nesse ser humano que me foi imposto. Na verdade, acredito que meu ser não satisfaça a nenhum molde. Não suporto padrões, convenções ou regras. Sou uma alma livre, que não pertence a nenhum grupo. Nenhum corpo me abrigaria adequadamente. Ora, eu não nasci para o abrigo, muito menos para o adequado.
  Esse anseio pela liberdade pode parecer uma utopia clichê, mas eu busco por algo muito além. Não consigo encarar a realidade e vivo em meu mundo paralelo. Alguns chamam isso de imaturidade, mas creio não ser tão patética assim. A verdade é que eu não consigo enxergar sentido em nada. Não tenho motivações para ouvir o que me dizem, para agir como age a maioria – todos esses corpos produzidos em série – ou para atender às expectativas alheias.
  Meu espírito livre vaga sonhando e fugindo da podridão em que o meu corpo inerte, inútil e morto se encontra. Meu ser é um mero reflexo da imundice daquilo que a humanidade se tornou. O que me difere dos outros é a minha transparência – afinal, quem quer ser um lixo, quando todos te desafiam a provar o contrário? Eu não temo em afirmar que somos todos uns lixos. Podres.
  A morte é a origem de inúmeras perguntas, mas, ao mesmo tempo, é a nossa única resposta. Para quê essa existência vã? Para quê tantos sofrimentos, tantos desgastes, tantas desilusões, se, no fim, seremos todos comidos por animais, tão nojentos e desprezíveis quanto nós, debaixo da terra? Para quê tanta vida?
  Quando morrermos, apodreceremos de fato. Mas essa será apenas a representação óbvia e concreta do que sempre fomos. Quem pensa que faz alguma diferença para o mundo está errado. As pessoas são substituíveis e a sociedade nunca sentirá a falta de ninguém. Todos seguem o que lhes é imposto para se afirmarem enquanto indivíduos vivos, porque, depois da morte, a verdadeira face de cada um será exposta sem a menor sutileza. Sem a mínima pena.
  Eu queria ser capaz de me iludir, de não perceber que sou um peso morto no mundo. Queria conseguir ignorar o fato de que existo e respiro, mas não vivo. E, se não vivo, é porque para isso não vejo motivos, não tenho perspectivas. Ao mesmo tempo, porém, ainda me flagelo por ser tão errada, tão estragada. Não queria ser eu aquela a exibir descaradamente a falha humana. Mas eu estou condenada a isso, porque sou densa – pessoas densas têm dessas coisas, esses frequentes problemas e angústias existenciais. São elas as que mais sofrem consumidas por essas depressões eventuais, e recorrem a métodos variados de escapismo.
  Quero fugir daqui, voltar para o meu mundo paralelo e para lá teletransportar não só minha mente, mas também o meu corpo. Estou cansada disso tudo. Tudo mesmo.  
  Onde fica a saída de emergência? Essa vida mais parece uma prisão. Nascer foi a coisa mais frustrantes que eu já fiz.

7 de fevereiro de 2011

Libertação

  Ela sempre quis saber o sentido daquilo tudo. Por que as coisas tinham que ser tão complicadas? Por que as pessoas não tentavam simplificá-las? Afinal, ela sempre teve muito claro em sua mente que, por mais que não ousasse encarar esse fato de frente, todos iriam morrer. Mais dia, menos dia, a hora de qualquer pessoa chegaria. Então, por que não viver mais rápido, evitar problemas e frustrações, aproveitar mais a vida? Por que as pessoas não valorizavam mais o ‘estar vivo’?
  Ela queria ser livre. Mas a liberdade que ela almejava ia muito além daquela desejada pela maioria das pessoas. Ela queria se libertar de tudo aquilo que fosse desagradável ou incômodo. Não queria perder tempo com nada que pudesse entristecê-la ou irritá-la. Ela evitava qualquer tipo de briga e não se deixava envolver demais com nenhuma situação. Era assim que ela gostava de viver. O restante do mundo que se explodisse.
  Ele nunca se importou com nada nem ninguém. Vivia sua vida mais ou menos, com um emprego mais ou menos, com relações mais ou menos. Estava sempre sob efeito de álcool e drogas, mas não via nenhum problema nisso. Aliás, a solução de sua vida estava ali, já que era o que dava a ele a sensação de liberdade.
  Ele nunca foi daqueles que pensam demais. Sempre evitou qualquer tipo de desgaste físico ou mental. Por que alguém gastaria a vida assim? O que ele queria era viver de verdade. Ou pelo menos no conceito que ele tinha de ‘viver’. O resto que se fodesse.
  Ele era perfeito para ela. Quando se conheceram, ela pensou que havia encontrado sua verdadeira alma gêmea, afinal, eles eram tão parecidos um com o outro. Eles se entendiam completamente. Tudo parecia muito certo. Mas ela guardava o ‘eu te amo’ para si mesma, e só. Falar uma frase dessas poderia arruinar a relação, mesmo que nem mesmo ela soubesse que tipo de relação era aquela. Além de tudo, amar não estava em seus planos e ia totalmente contra o ideal de vida de ambos.
  O tempo passou e já não existia mais ‘ela e ele’. Eles não estavam mais em sintonia. Enquanto ela pensava que eles diziam ‘foda-se’, juntos, para o mundo, ele dizia ‘foda-se’ para ela. Não dizia em palavras, porque não se importava o suficiente nem mesmo para deixá-la saber. Ela vivia iludida, e ele apenas vivia, como sempre fez.
  Era falsa a ideia de que ele estava apaixonado por ela, mas é irreal acreditar que ele nunca se deixara envolver, ao menos um pouco, com a suposta relação. Ele gostava daquela garota, mas descobriu nela algo precioso demais, raro demais. Ela era boa demais para ele suportar. E foi aí, ao sentir o peso que um sentimento poderia jogar nas suas costas, que ele resolveu continuar a vida que até então prosseguia. Sem aviso prévio ou alerta algum, ele sumiu da vida dela. E a vida sumiu dela.
  Ela descobriu que era impossível fugir do sofrimento, e seu conceito de vida começou a escapar do real. Isso aconteceu do modo mais cruel que ela conseguia imaginar. Veio acompanhado do sentimento de rejeição, da tristeza e da raiva. Raiva não só dele, mas também de si própria. Como ela deixou aquilo tudo acontecer? Ela que sempre quis ser livre, como deixou que se envolvesse tanto? Ela deveria ter fugido antes que fosse tarde demais, assim como ele fez. Mas ele o fez, porque pôde. Ela nunca pôde, porque sempre fora tarde demais.
  Perto dele, ela encontrava um lugar no qual queria ficar. Era com ele que ela se sentia segura, confortável, maravilhosamente bem. Os melhores momentos por ela vividos foram na companhia dele. Ela o amou e, se pudesse escolher, não haveria fugido desse sentimento que ao mesmo tempo a prendia e a libertava. Porém, ele não se permitiu amar e fugiu. Mas ela o guardou com carinho, em suas recordações. Ele também a guardou com carinho - ela foi o mais incrível desperdício de sua vida.